quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Sobre músicas ruins (e ainda bem que elas existem)

Enquanto escrevo esse post, ouço Quando Você Passa, de Sandy & Jr. Sim, querido e espantado leitor, a famigerada música do turuturuturu aqui dentro que faz turuturu quando você passa. Achei essa pérola em um dos vários cds que tenho da dupla, herança da minha infância que teve como um de seus pontos altos um grande show que eles fizeram em Uberlândia, que mobilizou minha família toda no parque num domingo de sol e praticamente inutilizou os ombros do meu pai, que me carregou neles durante toda a apresentação. Foi lindo, mas uma pena que eles ainda não tinham lançado o tal do turuturuturu, porque eu realmente gosto dessa música. Acho que nunca admiti isso em voz alta - ou voz escrita publicamente - e o objetivo desse post é justamente refletir por que a gente só comenta com as pessoas as coisas legais que ouvimos.

Não vou entrar no mérito da questão que gira em torno do que é legal ou não e o que raios faz algo ser legal ou por que She &  Him é melhor que Sandy & Jr. Para resolver isso, deixo com vocês o excelente artigo - infelizmente disponível só em inglês - de Jon Foreman a respeito do que é bom e ruim, o que é arte e o que é lixo. Um primor. Usando um argumento bem simplório, é possível dizer primeiro que músicas ruins são boas porque sem elas não seríamos capazes de perceber como as músicas boas assim o são de fato. Num mundo que vive só de Beatles fica difícil perceber porque aquilo que começou como uma boyband deu tão certo, encantando e emocionando marmanjo, crianças e mocinhas até hoje se não tivéssemos, por exemplo, os Jonas Brothers para fazer um contraponto. Assim como a gente só percebe o nível de realeza da Cat Power quando somos postos diante de uma música da Lana Del Rey tocando no rádio.

Ainda assim, não é disso que quero falar. Gostaria que existisse algum estudo que explicasse a mística que existe por trás das músicas ruins e o que faz com que elas sejam irresistíveis. De acordo com algumas matérias que li recentemente a respeito do fenômeno das músicas-onomatopéia (eu quero tchu, eu quero tcha; lêlêlê; tchetchereretchetche, oioioi...), somos atraídos por esse tipo de coisa porque elas apelam para a nossa sensibilidade musical mais primária. Vocês podem reparar que crianças pequenas adoram essas músicas e o que nos faz ficar com elas na cabeça o dia todo é exatamente esse ranço de infantilidade, um reflexo automático. Crescemos, vivemos, estudamos e consumimos cultura para que possamos sair desse primeiro degrau e evoluirmos para podermos responder a estímulos um pouco mais complexos. Falei bonito, né? Basta reparar que só pessoas mentalmente evoluídas conseguem apreciar, por exemplo, um cd experimental e conceitual. Ainda não cheguei lá, só queria me matar depois do show do Kraftwerk. 

O ponto é que por piores, mais pobres e idiotas que sejam a maioria das músicas ruins, a gente não consegue resistir a elas. Nem que seja pra ouvir no cantinho, quando ninguém está por perto, com scrobble desligado e tudo mais. A gente só conhece de verdade uma pessoa depois que ela confessa gostar e ouvir escondido alguma coisa socialmente reprovável. Se ela diz que não faz isso, ou é chata e xiita demais ou está mentindo. Vai dizer que você não sabe ao menos umas cinco músicas de Sandy & Jr, de cor, meio que por osmose? Quando começo a conversar sobre guilty pleasures musicais com meus amigos, perdemos horas e horas cantando tudo que vem a cabeça, assim como passei quase uma madrugada toda compartilhando tudo quanto é lixo irresistível que minha vinha a cabeça junto com Analu e Tary - ouso dizer que descobrimos a amizade verdadeira quando estramos no âmbito de compartilhar nossos funks favoritos. Fui dormir com Porta Aberta na cabeça e acordei cantando baixinho Tem Que Valer

Funny fact: essa última música bombou quando eu tinha uns 10 anos de idade. Eu achava ela linda e sonhava que um dia me apaixonaria por um surfista que ficaria me olhando enquanto surfava a onda perfeita - e em seguida, claro, eu rolava na areia e ficava louca, muito louca. 

Não louca o suficiente, no entanto, a ponto de negar que o mundo seria um lugar melhor de se viver caso ligássemos o rádio e tivéssemos Radiohead seguido de Chico Buarque na seleção de músicas mais pedidas, mas não sou igualmente insana para achar que É O Tchan e o Thiaguinho deveriam simplesmente pegar fogo. O que dançaríamos nas festas depois da meia-noite e o que cantaríamos nos karaokês da vida? Vocês que são cultos que me perdoem, mas na minha opinião pista de dança nenhuma sobrevive só de música eletrônica sueca e morro de preguiça de quem desperdiça uma noite no karaokê para cantar Norah Jones. Amo demais, mas ora bolas, quer coisa mais bonita do que enrolar a língua cantando Olhar 43?

Resumo da ópera: não levem a vida tão a sério e desconfiem de quem não sabe dançar Macarena. Ah: se sabe a coreografia de Asereje, boa pessoa certamente é.

Fonte: a genial página Unidos Contra o Indie
"Outside the fences of convention lies an untamed wilderness awaiting the reckless souls who have the nerve to cut their own path. Are you daring enough to defy the dictatorship of the critics? Are you strong enough to wander outside the lines? To dance to your own drum? To thrill to the ecstasy of unrepentant, unabashed euphoria?

Outside the fences, the explorers ignore the experts."
Jon Foreman
Esse post foi uma contribuição para a primeira postagem coletiva do Volta Mundo Blogueiro!, com o tema "Gosto, mas não assumo". E aí, quais são os guilty pleasures musicais de vocês?

8 comentários:

  1. Anna, é uma coisa dessas que me faz definir que você é a melhor pessoa que eu conheço. Anna, você é incrível. O conjunto, sabe assim? É ser cult e ouvir música clássica na cara da sociedade, enquanto lê Lolita, e dá uma escutada no funk ali no canto e assiste gossip girl. As pessoas deviam todas aprender com você. Eu não tenho mais o que falar, na verdade. Só vou ali publicar esse post no meu mural porque o mundo precisa dele.

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  2. Esse é um dos posts mais gênios que você já escreveu. Só acho que tinha que ter uma menção honrosa à Kelly Key, mas beleza. Hahaha! E, convenhamos, aquela conversa maluca foi uma das melhores que a gente já teve. Você escreveu exatamente o que eu acho: Los Hermanos é uma maravilha, mas dá pra dançar qualquer outra música - tirando Anna Júlia - em uma festa? Não dá. Por isso concordo contigo e com o Jon. Uma ode às músicas erradas, por favor. Sem elas todo mundo ficaria sentado e as pistas de dança das festas de 15 anos, casamentos e formaturas ficariam vazias. Seria o apocalipse da diversão despretensiosa, meu Deus. Graças aos axés errados, aos sertanejos breguíssimos e aos funks sem (tanta) baixaria. E deixa a gente ser feliz dançando as músicas ruins da vida, poxa! Dá até vontade de imprimir esse post e sair panfletando por aí. Raça pseudo-cult não vai curti, mas né? Hahaha!

    Beijos!

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  3. eu tenho orgulho de saber asejere, macarena e danço OiOiOi como ninguém! kkk
    ótimo texto!

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  4. Adoreeeeei. Sou dessas que fica dias com uma música ruim na cabeça, e não consegue ficar parada quando começa a tocar Kuduro, não importa onde esteja. E, afinal de contas, o mundo sem essas músicas seria muito mais triste.

    Beijos!

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  5. A minha é Não me perdoei Victor e Léo rs

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  6. Ninguém gosta das coisas que eu gosto e eu não gosto das coisas que todo mundo gosta. Não, não é forçado. É realmente assim.
    Mas que música ruim é feita a base de Super Bonder, isso é. haha

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  7. perai antes de mais nada nao consigo me conformar que essa musica do kaledoscópio já tem tanto tempo. tô te falando sério e eu nem lembrava mais, mas amo! entrou no meu coração e parou. to ouvindo aqui de novo pela segunda vez.

    e sandy e jr amo e gosto até hoje, mesmo entendendo que as traduções eram toscas e blábláblá. quando alguém me pede pra cantar qualquer música sempre começo com "as vezes me pergunto se.." ahahaha. é a nostalgia e minha pré adolescência toda... amo não negooo

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  8. Eu sempre digo isso para meu marido e para o meu amigo André (o André está para mim como o Matheus está para você): não levem a vida tão à sério. Só perdôo a rabugice (é com j?) se for um funk, em um carro, com alto falante do tipo que faz tremer as janelas.
    Passei por aqui porque deu saudades.
    beijos!

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